Caso de Violência Doméstica em Ponte de Lima.

Nestes autos de processo comum colectivo, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido

JOÃO ( nome fictício)de 42 anos, carpinteiro,  residente em Ponte de Lima.
Factos Provados
                O arguido e Maria (nome fictício) casaram entre si no dia 1 de Maio de 1990.
                Deste casamento tiveram dois filhos: Manuel (nome fictício), nascido em 1991 e Ana (nome fictício), nascida em 1997.
                Vive o casal, juntamente com os filhos, desde 1995, numa casa sita no Lugar de xxxxxx, freguesia de xxxxxxx, Ponte de Lima.
                Pelo menos desde 2000, todos os fins de semana, mantendo-se o comportamento até à dedução da acusação, o arguido, na referida casa, insultou a Maria, gritando-lhe os seguintes dizeres (sempre os mesmos, variando apenas o ordenamento no todo insultuoso): “Oh puta, oh vaca, filha da puta, andas amigada, sai daqui para fora para eu meter aqui outra mulher, estas putas vão acabar, estas vacas vão acabar…”
                O arguido prolongou estes dizeres durante todo o dia de cada sábado e todo o dia de cada domingo, intervalando apenas com as saídas que faz para o café.
                Desde pelo menos 2000 que o arguido deixou de tratar a Maria pelo nome, chamando-lhe “puta” ou “monte de estrume”, sempre que à mesma se dirige para lidar de qualquer assunto.
                Em 2003, em data não concretamente apurada, num corredor da casa do casal, o arguido muniu-se de um chicote, de características não concretamente precisadas, e com ele avançou para o filho Manuel, com o propósito de neste bater com tal objecto.
                Entre ambos interpôs-se a Maria, para impedir o arguido de assim atingir o Manuel; vendo Maria na sua frente, o arguido desferiu-lhe, com o chicote, várias pancadas no corpo, conduta que manteve até que o Manuel conseguiu retirar-lhe da mão o dito chicote.
                No dia 16 de Abril de 2006, pelas 00h, regressada a casa de residência do trabalho que desenvolvia, a Maria passou ao quarto que partilhava com o arguido e recolheu ao leito, onde este já se encontrava.
                Mal acabara a Maria de se deitar, o arguido fincou no corpo desta os seus pés e, empurrando com estes, jogou-a fora da cama, para o chão, onde esta caiu desamparada.
                No dia 14 de Fevereiro de 2009, ao fim da tarde, o arguido saiu do seu quarto, onde estivera até então a gritar os dizeres supra referidos no quarto parágrafo destes factos, dirigiu-se para a cozinha onde Maria diligenciava pelo jantar, muniu-se de uma faca de cozinha (com 20 cm de lâmina e 14 cm de cabo), que empunhou, encostou a ponta da lâmina desta às costas da Maria e vociferou “eu mato-te”.
Face a tal comportamento, Maria estacou, manteve-se quieta, dizendo ao arguido ‘’dá-me’’.
O arguido saiu então da cozinha, ali deixando pousada a faca, que Maria se apressou a recolher e a esconder.
No dia 29 de Março de 2009, entre as 12h e as 14h, enquanto Maria almoçava com os filhos, na cozinha da casa, o arguido, do seu quarto, gritava para Maria os dizeres supra referidos no quarto parágrafo destes factos.
A dado passo, decorria ainda o almoço, o arguido saiu para o exterior da casa, mantendo os mesmos dizeres gritados e mantendo-os depois quando de novo regressou a casa, sempre no decurso do almoço do almoço de Maria e dos filhos.
Instado pelo filho Jorge a que cessasse de dirigir tais insultos a Maria, o arguido lançou mão de uma faca de cozinha (com 10,5 cm de lâmina e 11 cm de cabo) e com ela avançou para Manuel, interpondo-se entre ambos Maria, por recear pelo que pudesse o fazer com faca.
Dando conta deste comportamento de Maria, o arguido arremessou para a mesa da cozinha a faca e, avançando para Maria, desferiu-lhe vários socos na zona abdominal, saindo Ana de casa a correr buscando socorro e acudindo Manuel à mãe para fazer cessar a conduta do arguido.
No dia 19 de Abril de 2009, por volta das 19h, o arguido dirigiu-se à cozinha da casa, divisão na qual se encontrava Maria, na companhia de Ana, ocupada com a preparação do jantar.
Abeirando-se de Maria, o arguido retirou-lhe da mão a colher da travessa, de metal, que aquela então usava nos seus afazeres, e com a mesma desferiu uma pancada no rosto de Maria, na sobrancelha direita.
Na manhã do dia 8 de Maio de 2009, na Procuradoria-adjunta de Ponte de Lima, foi o arguido constituído como tal nestes autos e nessa qualidade interrogado e sujeito a termo de identidade e residência; regressado a casa, por volta das 13h00, o arguido dirigiu-se a Maria, que se encontrava num dos quartos, e vociferou para a mesma: ‘’Oh, puta, quero-te fora de casa! Se não abandonas aquilo que tens lá no tribunal…rua; pões-te daqui para fora’’.
Todos estes factos foram praticados pelo arguido com o propósito concretizado de deixar Maria num clima de constrangimento e de, pelo terror permanente, a levar a ser-lhe absolutamente submissa e a comportar-se de modo a que ele, arguido, entendia conveniente.
Não se coibiu o arguido de levar a cabo os factos descritos na presença dos filhos Manuel e Ana, os quais, ao presencia-los ficavam aterrorizados e transtornados.
Como consequência directa e necessária das suas condutas deu causa o arguido a que Maria, Manuel e Ana se sentissem num permanente estado de terror e constrangimento, receando pelas atitudes que o arguido pudesse tomar, nomeadamente em relação a cada um deles e ao ambiente familiar, temendo, desde logo, que este pudesse alguma vez atingir de forma grave a integridade física ou a vida de Maria.
Temia esta, considerando as atitudes do arguido e os instrumentos que usava, que este pudesse alguma vez atingir-lhe de forma grave a integridade física ou tirar-lhe a vida.
Vivia também Maria vexada pelos nomes com que o arguido a podava e com as condutas que tinha em relação a si.
Agiu o arguido sempre de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito concretizado de vexar, amedrontar e manter Maria num permanente estado de constrangimento, sabendo, sem com isso se importar, que assim o fazia também relativamente a Manuel e Ana, indiferente à relação familiar que com estes mantinha e aos deveres que dessa relação para si nasciam quanto aos mesmos, nomeadamente de respeito, relação e deveres de que estava bem ciente. 
No dia 15 de Março de 2009, pelas 17h00, na sua casa, o arguido dirigiu-se a Ana, sua filha, que se encontrava a realizar os trabalhos escolares, lançou-lhe um das mãos ao cabelo, que agarrou e manejando assim pelo cabelo, jogou-lhe a cabeça de encontro à parede de cimento da divisão em que aquela se encontrava, fazendo com que embatesse com a testa, do lado direito.
Como consequência directa e necessária, sofreu Ana dores físicas e mal-estar.
Desde data que não foi possível apurar e até ao dia 15 de Março de 2009, na sua casa supra referida, o arguido teve em seu poder a espingarda caçadeira de marca FLZ, de dois canos sobrepostos, de alma lisa, com 70 cm de comprimento, de percussão central, tiro a tiro, dotada de Corunha de madeira castanha…
…o arguido continua a habitar com a mulher e os filhos. É consumidor habitual de bebidas alcoólicas, embora não reconheça que isso lhe possa ter causado qualquer dependência.
DO DIREITO

Medida de Pena






- absolvem o arguido João da prática de um crime de detenção de arma proibida
- condenam o arguido João pela prática, como autor material e em concurso real, de um crime de violência doméstica, previsto e punível pelo artº 152º, nº 1 a) e nº 2 do Cód. Penal, na pena de três anos e dois meses de prisão, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punível pelo artº 143º, nº 1 do Cód. Penal, na pena de 3 meses de prisão, e dois crimes de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artº 86º, nº 1 d) e 2º, nº 1 l), RJAM, em duas penas de 4 meses de prisão cada uma.
- em cúmulo jurídico, condenam o arguido na pena única de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão.

Ponte de Lima, 2009-11-24.


( Para conseguir ver melhor as imagens clique nas mesmas. )